Michel Jesus/Câmara dos Deputados
Gustavo Canuto: "A necessidade de investimento não pode ser obtida somente com os agentes públicos. Precisamos de parceria com a iniciativa privada”
Trazer a iniciativa privada para investir em saneamento básico foi a principal mensagem deixada nesta terça-feira (16) pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, em audiência pública sobre a Medida Provisória 868/18. A audiência foi promovida pela comissão mista que avalia a MP, editada no final do governo Temer.
Canuto mostrou que a previsão de investimento do Plano Nacional de Saneamento Básico de 2019 a 2023 é de R$ 112,3 bilhões e que, desse montante, R$ 44 bilhões virão de agentes federais. A longo prazo, a estimativa é de R$ 597,8 bilhões até 2033.
De acordo com o ministro, há atualmente R$ 4 bilhões disponíveis para saneamento. Para cumprir a meta de curto prazo (R$ 44 bilhões de 2019 a 2023), seria necessário mais do que o dobro dessa quantia por ano.
“Precisaríamos ter mais do que o dobro, quase R$ 9 bilhões por ano. A necessidade de investimento não pode ser obtida somente com os agentes públicos. Precisamos de parceria com a iniciativa privada”, disse Canuto.
Pequenos municípios
Ao avaliar o texto da MP, Canuto destacou a necessidade de garantir que os pequenos municípios não atrativos economicamente sejam atendidos com água potável e esgoto nos mesmos contratos dos que são atrativos (subsídio cruzado). Ele acredita que o modelo proposto pela MP não garante isso ainda.
A sugestão do ministro para melhorar o texto é que a iniciativa privada vá ganhando o mercado à medida que as empresas públicas melhorem sua capacidade de gestão. O recurso viria, então, da eficiência da gestão pública e da ampliação da rede de contribuintes: a companhia estatal melhora sua gestão e abre espaço para a iniciativa privada.
Também ao mesmo tempo, seria dado estímulo à prestação regionalizada por meio de blocos sustentáveis (aliando os municípios que não têm atratividade econômica aos que são atrativos).
O ministro disse que é preciso criar meios para que o setor de saneamento básico seja atrativo para a iniciativa privada, sem a inocência de achar que só porque é privado, é bom. “Nem toda concessão é bem-sucedida, nem todo serviço público é bem prestado. Independentemente de ser privado ou público, o que garante a eficiência é o contrato, a gestão e a fiscalização. Somos defensores de um serviço que atenda bem ao cidadão”, disse Canuto.
Sugestões de mudanças
O ministro fez outras propostas de avanço no texto da MP, que já havia tramitado no Congresso como MP 844/18, perdeu a validade em novembro e foi reeditada no mês seguinte.
Na avaliação de Canuto, é preciso cautela sobre a MP em relação à obrigatoriedade imediata de chamamento público, pelos municípios e pelo Distrito Federal, a empresas privadas. “A obrigatoriedade sem uma fase de transição pode causar a rejeição da MP no Congresso”, previu.
Na opinião dele, também é preciso definir com mais clareza a titularidade do serviço quando há interesse comum e a gestão for associada. A MP estabelece que os municípios e o DF são os titulares dos serviços públicos de saneamento básico e, na hipótese de interesse comum, o exercício da titularidade dos serviços será realizado por meio de colegiado interfederativo ou de instrumentos de gestão associada, por meio de consórcios públicos ou de convênios de cooperação.
Canuto defendeu ainda a divulgação de regras claras para o caso de alienação do controle acionário da estatal: clareza sobre os contratos de cada programa, por quanto tempo valem e se o ativo da estatal passa para a companhia que assume o serviço, caso venha a ser desestatizada. “Jogo aberto e bem definido para as companhias privadas entenderem e verificarem se vale ou não a pena entrar nessa situação”, explicou.
O ministro se posicionou favorável à possibilidade de subdelegação do investimento privado. Dessa forma, a companhia estadual poderia delegar parte ou integralmente os serviços para a iniciativa privada, permitindo a coexistência.
Ele também insistiu na adoção de um licenciamento mais simplificado e prioritário e no alargamento do prazo para os municípios instalarem seus aterros e se adequarem às normas de destinação correta dos resíduos sólidos.
Debate
A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), ressaltou que a entrada das empresas privadas pode trazer eficiência e maior alcance dos serviços. Ela comparou o saneamento com a abertura do mercado de telefonia, que se abriu para a iniciativa privada e, por causa disso, conseguiu popularizar o serviço.
Já o deputado Edmilson Rodrigues (Psol-PA) classificou a MP como “perversa”. “A MP entrega de mãos beijadas o princípio da universalidade do saneamento básico. Em Manaus, privatizar não deu certo”, afirmou.
Também contrário à MP, o deputado Afonso Florence (PT-BA) acredita que a medida seja inconstitucional. Ele reconheceu, contudo, um avanço no posicionamento do governo ao suprimir a obrigatoriedade de que os municípios façam o chamamento para empresas privadas. “Isso retira uma contradição que inviabilizava qualquer discussão sobre a MP. Considero que há um avanço na posição do governo”, declarou.
A comissão mista que analisa a MP é presidida pelo deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES) e tem como vice-presidente o senador Nelsinho Trad (PSD-MS). O relator é o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).